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1 de Julio, 2019

Violência Política

Roberta Eugênio, Instituto Alziras - Mais Mulheres na Política e Mais Políticas para as Mulheres

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A democracia brasileira conserva padrões em sua dinâmica que mantém os representantes políticos, em sua grande maioria, os mesmos que figuravam em períodos não democráticos, assim como, no que se refere aos hábitos, o que temos são reiteradas práticas violentas, que podem ser nomeadas como violência política, embora ainda não existam marcos legais na legislação nacional ou uma cultura política do país que repreenda essa prática.

Sem grande novidade, o quadro que é possível acompanhar no que se refere a representação repete o padrão ocidental do ser político: o que se tem como regra é a expressiva maioria de homens, brancos e de classe média na composição do Congresso Nacional Brasileiro (na Câmara dos Deputados 75 % dos Deputados Federais são homens e no Senado 87 % são homens), assim como na gestão do Executivo Estadual, Municipal e, claro, na Presidência. As mulheres, que representam 52 % da população brasileira, permanecem como minoria nos espaços de poder e decisão, realidade que se agrava quando falamos das mulheres negras (principal grupo populacional, 27 %) e de outros grupos, como os LGBTQI’s. Em relação às mulheres transexuais, por exemplo, apenas no último período eleitoral (2018) foi possível expor, também através da estréia na política de 3 deputadas transexuais, a gravidade de suas ausências. O campo da política institucional brasileira segue, deste modo, como retrato fiel das desigualdades estruturais aqui experimentadas, sendo a imagem do representante político aquela que descreve a mais bem sucedida minoria no Brasil: homens, brancos e de maior poder econômico. Em tempos em que os limites e desafios da democracia estão sendo tensionados, destacar a emergência daqueles e daquelas que, embora invisibilizados, constituem as maiorias populacionais, é um meio de se explorar uma das barreiras da política eletiva nas democracias contemporâneas: a representação.

Ademais, as garantias consolidadas na Constituição de 1988 no Brasil possibilitaram que políticas que reivindicassem a materialidade da igualdade fossem trazidas à tona. De modo que a sub-representação das mulheres, dos negros, dos indígenas e dos LGBTQI’s, pode encontrar terreno fértil para ser reconhecida como um problema sócio-político nos últimos 31 anos. Se o sufrágio universal possibilitou que mulheres no Brasil pudessem votar e ser votadas, há quase um século, hoje se compreende que não foi suficiente para que se materializasse a presença de mulheres na política, assim como é possível perceber que tampouco a lei de cotas para candidaturas de mulheres foi suficiente para que houvesse maior diversidade no poder. O que nos conduz a reflexão sobre as causas da política ser hegemonicamente ocupada pelos mesmos personagens, embora inexistam barreiras formais para o acesso de outros grupos. Os cientistas políticos e professores da Universidade de Brasília (UnB), Luis Felipe Miguel e Flávia Biroli, apontam três principais condições para acesso à política eletiva no Brasil: dinheiro, tempo livre e uma rede de contatos. É importante que a estas condições seja adicionada uma barreira perene para os grupos atípicos no poder: a violência política.

A violência política pode ser compreendida como toda ação ou omissão de um indivíduo ou um grupo que tenha como objetivo ameaçar, impedir, anular, suspender, prejudicar, constranger ou manipular o exercício político de uma pessoa ou grupo que esteja em cargo ou função política, eletiva ou não. Embora este conceito não seja tipificado no Brasil, é vasto o conjunto de marcos supranacionais e em três países da América Latina há legislação específica sobre o tema, México, Peru e Bolívia -a precursora de uma legislação própria sobre Violência e Assédio Político Contra as Mulheres . A maioria das ações no campo da Violência Política atualmente se encontram no debate de gênero, devido também a sub-representação. Compreende-se que a Violência Política é uma barreira de acesso à política, mas também uma forma de impedir o livre exercício político no desempenho das funções. Grupos vulnerabilizados pelas desigualdades sociais estruturadas pelo patriarcado, racismo, classe e sexualidade são os mais expostos a violência política, embora ainda haja polifonia sobre o conceito no Brasil, é possível reconhecer a violência política por meio da descrição dos ataques sofridos que são, sem sombra de dúvida, ataques a própria democracia.

A violência (não apenas a política) se agudiza nos discursos e ações contra a igualdade de gênero, raça e classe no Brasil. É chegado o tempo de defender os avanços para a democratização do acesso à política mas sem esquecer que dentre as condições para o exercício político, a reivindicação para que este ocorra livre de violências de qualquer tipo é uma defesa dos direitos daqueles que estão atuando hoje e de garantia para o futuro da nossa política, principalmente, da democracia.

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